sexta-feira, 24 de abril de 2015

Em seus braços

    


    Olhando para aqueles olhos que brilhavam como se houvesse um choro reprimido ali, eu poderia pedir qualquer coisa. Poderia revindicar uma promessa, poderia questionar sobre o passado que nem a ele pertencia mais, poderia pedir para que ele fosse ou para que ficasse. Mas o que eu precisava naquele momento era alimentar o meu egoísmo, aumentar a minha segurança boba e infantil e manter a pose de quem sabe o que está fazendo com a própria vida. 
     Demorei um tempo para abrir a boca e falar o que precisava. Não era falta de coragem, não era dúvida. É que sempre achei que um pequeno silêncio antes de grandes falas aumentam o seu poder de impacto. Quando abri a boca pude ver seus olhos encarando-a. Então falei o que precisava: “eu quero morar no seu abraço”.
     Um meio sorriso se formou nos lábios dele. O que veio a seguir eu não me lembro bem. Só sei que quando me dei conta eu estava entre seus braços, com a cabeça encostada em seu peito. Senti como se pela primeira vez em toda a minha vida eu tinha tomado a decisão certa.
     As malas, que eu havia feito depois da nossa última briga, eram um indício de que eu precisava de um novo lugar para viver. Toda a gritaria, a louça que fora jogada contra as paredes, as palavras que saiam cheias de fogo e entravam cortando... tudo foi necessário para que eu encontrasse o meu lugar, a minha certeza, o meu caminho.
     Eu não iria a lugar nenhum, nem ele. Eu poderia me livrar do pânico que sentia só de me imaginar tentando conhecer outra pessoa para acomodar o meu coração. Sempre fui péssima com os inícios, gosto dos meios, mas insisto em viver com a ponta dos pés nos fins, que é pra não me entregar à ilusão.
     Naquele momento, nada disso importava. Eu estava onde deveria estar. Os braços dele seriam o meu lar e o seu peito a cama que aconchegaria o meu ser. Enquanto ele me abraçava eu me sentia mais completa e inteira do que um dia achei capaz me sentir.
     Nos seus braços não havia medo, não havia dúvida, não havia “e se...”.
     Seus braços eram a minha certeza, a minha razão, o meu lar. E eu só sairia de lá quando inventassem algo mais forte e verdadeiro que um amor capaz de me levar da loucura à lucidez em um piscar de olhos. 

sábado, 18 de abril de 2015

Vontade de me jogar


     Alguma coisa estava mesmo diferente, ainda meio fora do lugar. Era como se meus sentimentos fossem blocos de montar nas mãos de uma criança, tentando encaixar aqui e ali e às vezes encaixando errado, torto, mas ainda assim encaixando. Como um quebra-cabeça que insiste em não encaixar bem certinho e sempre deixar umas frestinhas pra poder ver a cor da mesa embaixo. 
    Como sempre, eu parei pra pensar sobre isso por que só sentir essa confusão não estava sendo o suficiente pra entender. Então eu me surpreendi quando me peguei rindo. Rindo da sensação de não saber nada do que está acontecendo, mas ainda assim gostar de verdade do que toda essa confusão me força a sentir. 
     Sim, essa confusão me faz feliz, me faz sentir mais viva e mais presente numa confusão maior ainda que é esse mundo. Uma confusão dentro de outra confusão, assim mesmo sem explicação, sem regras, sem manual de instruções, sem ter que estar tudo no seu devido lugar pra estar certo. Uma bagunça boa de sentimentos e vontades. Como um quarto lotado de brinquedos coloridos e chamativos jogados por todos os cantos aos olhos da criança mais travessa. Uma bagunça que faz bem, que ensina, que não tem medo, que apenas quer ter paz na sua própria forma confusa de ser. 
    E a única coisa que me restou depois de tentar entender foi admitir que na verdade não quero e nem preciso entender o que está acontecendo, já não preciso ser tão racional e controladora quando apenas fechas os olhos e sentir já é o suficiente pra me fazer levantar todas as manhãs com um leve e sincero sorriso no rosto. Agora a sensação de me jogar sem saber o que vou encontrar lá embaixo não me intimida, eu quero me jogar. E pra se jogar não é preciso entender muita coisa.

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